domingo, maio 20, 2012

TEMPOS





Antes do mar, da Terra e Céu que os cobre


Não tinha mais que um rosto a Natureza:

Este era o Caos, massa indigesta, rude

E consistente só num peso inerte.

(Metamorfoses, de Ovídio)



Até que um dia mataram-na, comeram-na e passaram-se  anos.

(Uma Galinha, de Clarice  Lispector)




Há tempos, e numerá-los não se poderia,
as contas se inverteram: agora é sempre 
um a menos e não a mais.

Há-de zerar-se, sempre.

Noto que os sorrisos sumiram,
ou sempre que surgem
estou olhando na direção errada.

Há-de amargurar-se, sempre.

Algo dentro de mim se quebrou,
da estirpe divina ou sangue da terra,
já não sei-me em mim mesmo.

Há-de fugir-se, sempre.

E os amigos, que são deles?
Quando a estrada fez a curva
que os tirou da minha vista ansiosa?

Há-de perder-se, sempre.

E quando o leite azedou?
E as plantas secaram?
E as crianças cresceram?

Há-de dormir-se, sempre.

Dizer o futuro é, agora,
ao contrário de há muito,
ter a certeza.

Há-de findar-se, sempre.

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