Ali, distante e melancolicamente bela, ela estava. Olhando de si para si, fugindo do olhar dos outros, parecia deslocada e assustada. Incomum. Sem máscaras, seus olhos pareciam dois grandes botões de rosas, prontos para assumir sua fragilidade e sua brevidade naquele deserto. Brancos. Botões brancos. Puros e intocados pois as mãos dos jardineiros sempre lhe foram estranhas.
Súbito, seus olhos se cruzam com os meus. Indiscretos, meus olhos faziam sombra a sua clareza. Ela sentiu o golpe e, num ímpeto, apertou com tanta força o copo que segurava, que este quebrou e a cortou. O sangue encheu um lenço e não era mais dela. Era o meu. Não-convidado, invadi com minha aspereza e sede seu espaço. Ela começou a correr, em direção ao banheiro. Fui atrás, pra me desculpar.
Interrompi sua fuga no meio. Ela virou-se, os botões de rosas me feriram, me lembraram da minha condição humana, previsívelmente desnecessária. Queria dizer-lhe que a entendia, mas não entedia de fato. Que era como ela, mas meus olhos não a enganariam. Que poderia mudar, mas nem as palavras, nem o sentido, se construiriam defronte aos meus olhos cansados e tristes. Beijei-a, roubando o que restava. Fui-me, como o ladrão envergonhado.
Em casa, encarei por longas horas o teto, sem piscar. Fechando os olhos, via como se tivesse encarado dois sóis, o reflexo daqueles botões em minhas retinas. E senti-me ainda mais triste por ser o que sou.
Can't stop reading...
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